sábado, 26 de setembro de 2009

Estabilidade: uma faca de dois gumes.

Já há algum tempo, venho pensando no lado negativo da estabilidade no serviço público. No quão prejudicial ela é quando os servidores se aproveitam da mesma para não trabalhar.

Antes que comecem a atirar pedras, é importante salientar que não são todos os servidores públicos que se aproveitam do fato de não poderem ser demitidos (a não ser que cometam uma falta muito grave e, mesmo assim, ainda deverá haver um processo administrativo em que lhe será garantida ampla defesa).

Não gosto de suposições. Prefiro estatísticas, fatos, experiências. Nada fictício. Situações reais.

Citarei alguns exemplos ocorridos ontem, sexta-feira, em três varas distintas de Tribunais distintos da nossa capital: Terra da Luz.

Aproximadamente, às 14:45h da tarde, dirigi-me a uma Vara da Justiça do Trabalho para verificar o andamento de um processo. Assim que entrei na Secretaria da Vara, a servidora falou algo extremaente audaz:

"Gente, hoje é dia de calmaria, sexta-feira, dia de desopilar"

Realmente, há dias em que a gente está muito calma e finge que não escuta determinadas barbaridades que são proferidas por alguns seres "humanos", pois, do contrário, eu teria dito a ela: "Pois é, hoje é sexta, mas ainda é dia de trabalho e ainda há expediente!"...

Simplesmente, a servidora estava me dando uma indireta (aliás, foi uma direta mesmo), informando que dia de sexta-feira não é dia de ninguém ir atrás de nada nas varas, pois é dia de descanso... Inclusive, os servidores já estavam entrando no clima do fim de semana:  um som altíssimo, tocando dance, altas conversas, risadas; se bobear, alguns já estavam dançando, trabalhar que é bom...  

Já que citei a referida servidora,  recordei-me de que ela, em outra ocasião, abandonou uma tarefa no meio, pois faltavam 5 minutos para a sua saída. Simplesmente, olhou para o relógio e disse:

"Meu horário já está acabando, a pessoa do outro horário vai ver pra você."
E foi-se embora.

Quando o funcionário do horário seguinte chegou, informou que não podia procurar o processo pois ele não tinha iniciado o procedimento. Resumindo: nem um nem outro resolveram o problema.

E, dessa forma, os cidadãos, em sua maioria, desprovidos de um conhecimento sobre como as coisas devem funcionar vão sendo enrolados e os processos na Justiça vão se arrastando por anos. Há servidores que, definitivamente, não se preocupam nem um pouco com a situação das pessoas que vão em busca de justiça.

Ao perguntar se demoraria muito para a liberação de um alvará, a servidora soltou essa:

"Calma, pra que esse desespero?! O dinheiro vai sair. Já tá lá. Acho que no final da outra semana a Juíza assina o alvará".

É nesse momento que aquela frase antiga e popular realmente mostra a sua veracidade: "No dos outros, é refresco..."

Vivemos numa sociedade capitalista, tudo custa dinheiro e custa caro. Existem milhões de pessoas desempregadas. Qualquer quantia que alguém esteja esperando receber é de suma importância, mas, para determinados funcionários públicos, que estão tranquilos, pois, ao final do mês, entrarão aproximadamente uns 7 ou 8 mil reais em suas contas; a parte ir atrás de um direito é algo impertinente e desnecessário...

Uma frase que me deixa absolutamente indignada é : " A Justiça é lenta porque não temos pessoal suficiente" . Mentira! A Justiça é lenta porque, infelizmente, grande parte dos servidores não quer e não trabalha como deve! E essa conduta vergonhosa não se limita só ao Judiciário. Em todas os poderes isso acontece.

Não conto as vezes em que me dirigi a um órgão público e passei horas esperando enquanto rolava o maior bate-papo entre os funcionários. Fofocas, divagações, comentários acerca da novela, das celebridades. Tudo  é motivo de ocupação nas repartições, exceto o trabalho que ali deveria ser feito. 

Mas, voltando às experiências de sexta-feira...

Saí da Justiça do Trabalho e fui ao Fórum Clóvis Beviláqua. Em uma das varas de Falências, às 15:40h, a juíza sequer tinha aparecido e não havia previsão se ela iria trabalhar.  Em outra Vara Cível, o Juiz também não tinha dado as caras. O que comprova que o descaso, a desídia, o desrespeito para com a função pública encontra-se em todos os graus de hierarquia.

Vendo esses exemplos, tenho desejo de que a estabilidade tenha fim. Por que será que no setor privado tudo funciona(pelo menos melhor que no serviço público)? Porque se um funcionário privado maltratar um cliente, não executar suas funções como deve ou se recusar a fazê-las, ele será punido ao contrário do que ocorre no serviço público.

Creio que as pessoas de bem, que realmente querem trabalhar e honrar a função pública, não se preocupam se vai haver estabilidade ou não, afinal, elas trabalham corretamente. Entretanto, para uma parte razoável do funcionalismo público, que vai às repartições só bater o ponto e esperar o tempo passar até o fim do expediente, o fim da estabilidade seria motivo de noites de insônia, de desespero, pois teriam de fazer o que lhes dá mais temor: trabalhar!

Todavia reflito: a lei 8.112/90 prevê punição para condutas nocivas à finalidade pública nas repartições. Questiono-me se o mal realmente seria a estabilidade ou a não aplicabilidade do estatuto. Entretanto, como o chefe imediato vai saber que o seu subordinado não está trabalhando corretamente se ele mesmo não está lá?

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